Trump, o ‘Serial Killer’ dos Tratados
Manlio Dinucci
O Presidente Trump anunciou a retirada dos Estados Unidos do Tratado Céus Abertos/Open Skies. Assinado em 1992, imediatamente após o final da Guerra Fria e iniciado em 2002, permite que cada um dos 34 Estados Partes sobrevoe os territórios dos demais com aviões de reconhecimento (desarmados), equipados com sensores para recolher dados sobre forças e actividades militares. Cada Estado Parte deve aceitar um certo número de sobrevôos sobre o seu território, a cada ano e tem o direito de realizar o mesmo número nos territórios daqueles que realizaram esses vôos. Nos termos do Tratado, mais de 1.500 vôos foram realizados desde 2002, incluindo vôos recíprocos entre os Estados Unidos e a Rússia. Embora, actualmente, os satélites possam fornecer informações mais detalhadas do que as recolhidas pelos aviões, o Tratado mantém a sua utilidade técnica, pois nem todos os Estados Partes têm as capacidades dadas pela utilização de satélites. O significado político do Tratado permanece importante como um acto de confiança.
Aponta precisamente ao afrouxamento, a decisão da Administação Trump de se retirar do Tratado, com o objectivo claro de aumentar a tensão com a Rússia. Para esse fim, o mesmo argumento foi adoptado em 1 de Fevereiro de 2019, quando o Secretário de Estado, Mike Pompeo, anunciou que, após seis meses de suspensão, os Estados Unidos se retirariam do Tratado das Forças Nucleares Intermédias, como de facto aconteceu em Julho do mesmo ano. Ao anunciar que os Estados Unidos se retirarão dentro de seis meses do Tratado de Céus Abertos, Mike Pompeo usa praticamente as mesmas palavras: declara que “só a Rússia é responsável por estes procedimentos”, acusa-a de “erosão contínua da arquitectura do controlo dos armamentos”, define-a como “violadora contínuo de muitos compromissos assumidos”. Também desta vez, não é apresentada nenhuma prova real destas argumentações.
Declarando que “esta não é uma história que se refira exclusivamente ao Tratado Open Skies”, o Secretário de Estado anuncia outras decisões da Administração Trump na mesma direcção. Durante mais de um ano, o Presidente Trump repetiu que não renovará o novo Tratado Start, concluído em 2010 pelos Estados Unidos e pela Rússia. Este Tratado, como salientamos em 2010, no ‘il manifesto’, tem limites notáveis: estabelece apenas um limite para “ogivas nucleares instaladas”, ou seja, aquelas prontas para serem lançadas em meios de transporte estratégicos com alcance superior a 5.500 km, fixados em 1.550 por parte; também não prevê nenhum controlo efectivo sobre o aprimoramento qualitativo das forças nucleares. No entanto, a retirada dos Estados Unidos do novo Tratado Start tornaria o confronto nuclear ainda mais perigoso. O Presidente Trump disse que só poderia renovar o novo Tratado Start se a China também participasse no mesmo, uma possibilidade até agora rejeitada por Pequim. No entanto, se participar, nos termos actuais, a China poderia aumentar o número das suas ogivas nucleares de cerca de 300 para mais de 1.500 (excluindo a hipótese de que Washington e Moscovo estariam dispostos a diminuir as deles para 300 unidades).
Outro tratado do qual os Estados Unidos podem retirar-se é o da Proibição Total de Ensaios Nucleares, que Washington assinou em 1996, mas nunca ratificou, enquanto Moscovo o ratificou em 2000.
Neste contexto, a anunciada retirada dos Estados Unidos do Tratado Open Skies constitui um novo passo em direção a uma verdadeira e deliberada estratégia de tensão. Visto que aderiram ao Tratado 23 países europeus da NATO, incluindo a Itália, a retirada dos Estados Unidos, aumentando as tensões com a Rússia, envolve automaticamente a NATO. É exactamente o que pretendem em Washington. Num comunicado de imprensa conjunto publicado ontem, 8 países da NATO (Bélgica, França, Alemanha, Itália, Luxemburgo, Holanda, República Checa, Espanha), além da Finlândia e da Suécia, manifestaram o seu “descontentamento” pela intenção da retirada do Tratado Open Skies, anunciada pelo governo dos EUA, “embora partilhemos as suas preocupações sobre a actuação da parte da Federação Russa sobre as cláusulas do Tratado”. No entanto, declaram: “Continuaremos a dar cumprimento ao Tratado Céu Aberto”. Um sinal de abertura cauteloso, mas apreciável, enquanto a sombra ameaçadora da guerra nuclear cobre cada vez mais os céus.
il manifesto, 23 maggio 2020
Tradutora: Maria Luísa de Vasconcellos
Email: luisavasconcellos2012@gmail.com
Webpage: NO WAR NO NATO
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